segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Adoção de crianças Guarani é contestada pela Funai

Entre as matérias veiculadas pelo jornal O Estado de São Paulo deste fim de semana destaca-se esta sobre a questão de adoção de crianças Guarani do Mato Grosso do Sul.

Tudo indica que o Conselho Tutelar de Dourados tem sido muito aberto na retirada de crianças Guarani do convívio de seus pais e de seus parentes por causa de alegados maus-tratos.

Há um elemento muito claro de preconceito nessa atitude, mas há também boa vontade por parte dos conselheiros. Não é admissível que crianças sofram maus-tratos por pais em dificuldades. Mas também não é possível ser duro com pais que têm dificuldades crõnicas de sobreviver. Por sua vez, a atitude da administradora da Funai é correta, na medida em que ela busca defender as crianças indígenas e dar-lhes condições de viver no meio de seu povo. A idéia de outros índios adotarem crianças cujos pais os relegam é muito importante para resolver parte dos problemas.

Em outras épocas de nossa história brasileira, era muito comum tirar crianças das aldeias indígenas para serem criadas nas casas dos ricos e até dos remediados. No final, ao invés de serem filhos, viravam criados.

Não digo que seja o caso na atualidade. Mas é preciso ter muito cuidado com isso tudo.

_______________________________________________________

Funai quer barrar adoções em MS
Justiça minimiza critério étnico para entrega de menores


Crianças e adolescentes indígenas em Dourados (MS) têm sido retirados das famílias e colocados para adoção sem nenhum critério que respeite suas diferenças culturais. Esse é o entendimento da Fundação Nacional do Índio (Funai). “Índio fora da tribo sofre muito mais, principalmente preconceitos. Tem comportamento diferente dos não-índios, portanto precisa viver com suas raízes, sua gente”, diz a administradora da fundação na cidade, Margarida Nicolletti.

Ela conta que a procuradoria da Funai já entrou com ação, com base no Estatuto do Índio, para cancelar processos de adoções por famílias não-índias que estejam em andamento ou já concluídos. Segundo o juiz da Vara de Infância e Adolescência, Zaloar Murat Martins, há quatro processos de adoção em andamento e um concluído, que é contestado pela Funai no Tribunal de Justiça.

As crianças são vítimas de maus tratos de pais ou familiares que são recolhidas pelo Conselho Tutelar de Dourados e levadas aos quatro abrigos de menores da cidade. Depois de 60 dias, tornam-se responsabilidade da Vara da Infância e Adolescência, que as põe na lista de adoção.

O juiz Martins explica que obedece ao Estatuto da Criança e do Adolescente. “Menores de idade são menores, não importa a raça. Qualquer um que esteja sofrendo maus tratos tem que ser assistido. A destituição do vínculo familiar e a seguida adoção são medidas perfeitamente legais. Procuro todos os meios possíveis de evitar esse caminho, mas existem situações que não deixam alternativas.”

Ele conta que um caso de maus tratos foi de uma menina de 3 anos que foi levada da aldeia Jaguapiru para o Conselho Tutelar. “Sempre que a criança ia comer, sentava ao lado do botijão de gás na cozinha. Esse comportamento é conseqüência do tempo em que viveu acorrentada a um botijão de gás, em sua casa”, diz. “E existem coisas piores, como abusos sexuais”, confirma o presidente do conselho, Josimar Nunes dos Santos. Para o vice-presidente do conselho, Paulo César da Silva, “é gritante a violência contra os menores nas aldeias da região sul” de Mato Grosso do Sul. “Tudo por causa do alcoolismo. Existem casais que quando não encontram cachaça, tomam álcool com água e ainda dão a mesma mistura para os filhos menores.”

Hoje há 8 menores indígenas nos abrigos. No ano passado, as quatro casas chegaram a receber 30 a 40 jovens e crianças vítimas de maus tratos nas aldeias. O presidente do Conselho Tutelar esclarece que a Funai está retirando os menores dos abrigos e procurando famílias indígenas para abrigá-los, antes de entrarem na lista de adoção.

Margarida conta que no último ano encaminhou 12 meninas e meninos para famílias indígenas. “Visito todos eles e estão muito bem entrosados com a nova família, dentro da aldeia. Tem jeito sim de evitar as adoções de índios por famílias não-índias.” O cacique Ambrósio Vilhalba, de 50 anos, da Aldeia Guiraroka, concorda. “Tenho 22 filhos adotivos, a maioria já é maior de idade. Também acho que índio tem que viver na aldeia, junto com índio.” Getúlio Juca, da Aldeia Jaguapiru, uma das mais violentas da Reserva Indígena de Dourados, adotou 19 e Luciano Aerovalo, da Aldeia Bororó, 17.

Não há levantamentos sobre o número de adotados nas aldeias do Estado nem de crianças ou jovens para adoção. O juiz Martins explica que a Vara da Infância e Adolescência tem apenas três anos de existência. “Antes os casos eram atendidos pela Vara Criminal. Nós temos a quantidade registrada de adoções ocorridas antes da instalação da Vara da Infância e o número de casais interessados em adoções, não apenas de índios, mas de outras crianças. São quase 50 casais.”

A administradora da Funai conta que está preparando um estudo sobre isso. “Esses números são muito importantes para nós e vamos conseguir levantá-los em toda a região sul do Estado. O que não vou admitir é ver o Conselho Tutelar recolhendo indiozinhos e os colocando à disposição do Judiciário.”

Nenhum comentário:

 
Share